sábado, 17 de novembro de 2007

Língua x Fala

Bom, agora já temos subsídios suficientes para compreendermos as dicotomias saussurianas, que impressionaram mais pela sua complexidade que pela novidade no método de abordagem.

O pensamento do mestre à cerca de língua e fala não é simplesmente de que ambos são, juntos, os componentes da linguagem. Seu pensamento vai além, porque aborda a linguagem como algo que se divide em língua e fala, ao mesmo tempo, onde língua e fala se interligam (CLG, 17 e ELG, 24 e 60).

Uma coisa é tomarmos á língua, de forma autônoma, como ponto de partida - e nos formamos ouvindo que essa teria sido a opção saussuriana de abordagem - ou, ainda, investigarmos os fatos da fala isoladamente da língua, outra, é nos obrigarmos a admitir que a língua social, mental, não se perfaz sem a fala de forma que nem a alcançaríamos acaso fossemos uma sociedade áfona. Por isso, acreditou Saussure que a fala, através do signo, organiza o pensamento para a linguagem (CLG, 130/131 e ELG, 45). E fala individual - fenômeno acústico e psíquico - também não pode ser considerada sem a língua. Considerar apenas uma seqüência de ondas sonora - figura vocal - é possível, mas dirá respeito apenas às abordagens da Física.

Fica fácil perceber onde o lingüista amarrou seu burro, afinal, foi justamente diante de um objeto a ser analisado a partir de sua ligação com um outro objeto que, no momento de análise, estão forçosamente amalgamados (ELG, 21/22).

Quem fala emite um som sobre o qual já considerou mentalmente. O som do que se fala, antes de ser físico, buscou uma impressão mental com valor lingüístico; buscou o signo. Só irá falar quem já tem em sua mente uma organização de significados unidos aos significantes de forma arbitrária, e que, apesar disso, não poderiam facilmente se desunir dentro do cérebro. Significado e significante ficam assim, armazenados, esperando a hora de entrarem na ciranda do discurso através da fala. Assim é que se pode afirmar que a língua, nos fatos da linguagem, se encontra na mente do falante; onde estão associados os conceitos às imagens acústicas (CLG, 19/20 e ELG, 22).

Fica assim entendido: Linguagem é o resultado da interação entre língua e fala e não simplesmente da associação, e muito menos da união, entre ambos.

É através da fala que a língua se atualiza e se transmite através do tempo e das pessoas, das comunidades de fala, e que os pensamentos são organizados em signos dentro da mente. E é pela língua que a fala se programa e acontece, ao mesmo tempo, no presente e no passado. A fala projetaria a língua para os fatos da fala; para a comunicação. A língua, por sua vez, resultaria das impressões da fala sobre o exercício mental, do esforço mental em traduzir os pensamentos em signos.

À realização individual da língua através da fala Coseriu (1973:97) chamou norma, que nada mais é que a fala como, de fato, ela é. (Carvalho, 82).

E é isso! Espero você para pensarmos, juntos, a próxima dicotomia saussuriana: Sincronia e Diacronia.

Bibliografia Consultada.

* Além das sugeridas pelo Lingüístic@.com

CARVALHO, Castelar. Para compreender Saussure. Petrópolis-RJ, Vozes, 2002.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Linguagem...

Retomando o nosso bate-papo sobre lingüística saussuriana, é bom relembrar o conceito de linguagem para Saussure, bem como o quanto considerou desafiante para a lingüística a determinação de uma entidade lingüística devido à própria situação de complexidade da linguagem e, de como surge a necessidade de “dividir” os elementos formadores da linguagem numa tentativa de se compreender o elo forçosamente existente entre eles.

Segundo o CLG, para Saussure, a linguagem possui um lado individual, a fala, e um lado social, a língua. Desta forma, a linguagem implicaria num sistema estabelecido e numa evolução; isto porque é uma instituição atual, ao mesmo tempo em que é, também, um produto do passado (CLG,16 e ELG, 40).

De fato, é na situação de fala que a linguagem existe completamente. Porém, neste dado momento, todos os falantes colocam em prática uma língua dada; conhecida por todos e que é falada por sua comunidade desde sempre. Essa mesma língua é reinventada e atualizada no exato momento de sua execução através da fala, entretanto, no momento justo em que são pronunciados seus enunciados eles vão, na medida em que são articulados, ficando no passado.

A complexidade da linguagem não reside apenas no fato de ser uma entidade do presente e do passado, ao mesmo tempo. Sua condição dual também contribui para isso, o que dificulta para o lingüista a tarefa de determinar uma entidade lingüística (ELG, 21).

A dificuldade está justamente no elo entre os elementos constituintes da linguagem, que, separadamente, jamais pederiam ser representados por uma simples soma de fatores isolados e autônomos, e, sim, pela divisão de um só elemento em dois fatores autônomos e interdependentes. O que impossibilita ao pesquisador analisá-los separadamente como faria um químico ao analisar os elementos formadores do ar, por exemplo.

O fato, é que, de um lado tem-se um fenômeno vocal como tal; o som ou a figura vocal, e do outro um fenômeno vocal como signo. O primeiro; um fato físico e objetivo, o segundo; um fato mental e subjetivo. (ELG, 24/25).

Se, como se pensava mesmo no tempo de Saussure – e ainda pensam alguns na atualidade, a dualidade bifurcasse som e idéia, a lingüística estaria diante de um elemento simples, uma vez que sua tarefa consistiria em determinar o que é de ordem física e o que é de ordem psíquica na linguagem.

Porém, o que a lingüística tem a determinar, não está, para o mestre genebrino, num ou noutro elemento formador da linguagem, mas na ligação entre eles.

E é justamente na complicação que se estabelece, ao se buscar compreender em que momento e de que forma, exatamente, uma seqüência de ondas sonoras se torna capaz de representar uma idéia, um conceito mentalmente unido a uma imagem acústica, que parece ter surgido a necessidade saussuriana de separar e dicotomizar os conceitos já existentes.

E, assim, o fez Saussure: Dividiu o objeto de sua investigação sem, no entanto, desconsiderar o elo que faz com que cada elemento, abordado a partir de um dado ponto de vista, seja encarado como apenas um lado de uma mesma moeda.

A mesma lógica de investigação foi aplicada ao signo. O que torna mais fácil a compreensão da dicotomia Língua/Fala da qual trataremos na postagem à seguir.

Até breve!

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Arbitrariedade absoluta e arbitrariedade relativa do signo.

Durante este período de ausência de post no blog estive analisando as entradas para ele. Mais de 80% delas advêm de pesquisas google feitas no Brasil e em Portugal, pelas quais sou muito agradecida. Tal análise me permitiu verificar quais os temas que mais freqüentemente motivaram essas buscas, e no que se refere aos assuntos já tratados, pude perceber que, sobre os signos, faltou esclarecer um pouco mais sobre a arbitrariedade, uma vez que não se falou sobre arbitrariedade absoluta e arbitrariedade relativa.
Bem, condição de arbitrariedade, como vimos, está diretamente ligada ao fato de o signo ser ou não motivado. Quando se fala arbitrariedade absoluta diz-se total falta de motivação, e, quando se diz arbitrariedade relativa, diz-se, também, motivação relativa ou, considera-se ter havido aí alguma ligação motivada entre significado e significante.
Mas, para que fiquem bem claros estes conceitos, e sobre eles não paire a menor dúvida, faz-se necessária à compreensão precisa do termo motivação dentro da perspectiva saussuriana.
Nós temos alguns elementos que nos servem de sinal; de representatividade de algo mais que não está explícito totalmente no elemento que o representa. Estes elementos representativos; sinais, tanto podem ser de caráter natural, quanto convencional.
Os sinais de caráter natural são aqueles que nos servem de indícios dos fenômenos naturais, como, por exemplo, a fumaça, que nos indica a presença do fogo, ou o trovão, que nos aponta para a possibilidade de chuva.
Os sinais de caráter convencional são aqueles que a sociedade contratou, concordou, a partir de algum momento, que seria o que melhor representaria, dentro daquela realidade de fala, uma idéia tal. O ícone, o símbolo e o signo são esses sinais criados dentro da coletividade de fala.
Por ser totalmente imagístico, o ícone é totalmente motivado, isto porque só se faz uma imagem a partir de um dado elemento. A foto de Maria deve consistir na impressão da imagem de Maria. O mesmo ocorre com a estatueta de um pássaro, ela deve consistir num conjunto de características inerentes àquele pássaro que pretende representar. O ícone deve impressionar os sentidos de forma tal que não permita confusão alguma no momento de identificá-lo e saber o que ele representa. Ele é motivado por aquilo que representa.
O símbolo é menos motivado, isto porque não tem que representar uma idéia exclusiva, mas uma idéia genérica. Dessa forma, uma pomba branca pode trazer a idéia de paz, seja lá o que for que a paz signifique para quem a percebe. De igual modo têm-se uma balança para representar a justiça, independente do conceito que cada indivíduo tenha deste termo. Assim, qualquer balança serve para trazer a idéia de justiça, mas, nem toda imagem de ave serve para representar um falcão. Por isso diz-se do símbolo que é relativamente motivado.
O signo não possui motivação nenhuma, por isso é totalmente arbitrário, porque o nome em nada está ligado ao objeto nomeado. Uma criança pode ser, ao mesmo tempo, um menino, uma garota, um guri ou um piá. Todos esses signos representam bem a idéia de infante. E, poderíamos, ainda, considerar que, cada idioma tem seu conjunto próprio de signos para designar a mesma idéia. Isto prova que o signo não está ligado ao que representa de forma motivada, mas imotivada.
Porém, quando temos o numeral dez e o numeral nove, temos dois signos absolutamente arbitrários. Mas, quando temos o numeral dezenove, a arbitrariedade torna-se relativa, isto porque dezenove é a junção de dois conceitos distintos que são representados por signos diferentes. O signo que surge dessa junção é fiel às idéias contidas nos signos anteriormente separados, e aí está a motivação.
No próximo post abordaremos a dicotomia langue/parole a partir do conceito saussuriano de linguagem. Até breve!

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

O signo saussuriano.


A análise dos principais aspectos do signo saussuriano será feita a partir das colocações CLG e dos ELG. Apesar de considerar o fato de o primeiro livro ter vindo à tona desde o início do século passado e definido os fundamentos da lingüística saussuriana até o presente momento, tomaremos as considerações do livro atual, elucidando de forma mais profunda os seus pensamentos a cerca da lingüística e seu objeto. Dessa forma, não seria de mais solicitar do leitor a atenção devida quanto a esta fusão de conteúdos porque, provavelmente, em muitos cursos de Letras, as considerações sobre os ELG não estão, ainda, sendo consideradas e, portanto, essas informações não são vigentes para a fundamentação teórica do curso. Porém, que fique claro que, o objetivo maior desse blog é buscar esclarecer um pouco sobre o pensamento saussuriano no que diz respeito à linguagem, e para isso estaremos sempre abordando o CLG, os ELG e seus ensaios sobre fonética do indo europeu. Espera-se, a partir de tal abordagem, que possamos fornecer elementos que auxiliem na compreensão dos fundamentos lingüísticos e da genialidade do mestre de Genebra.

É importante, antes de tudo, compreender que considerou Saussure o signo como uma entidade dicotômica e psicológica . Dicotômica por dividir-se em duas faces; significado e significante. Psicolígica por unir essas duas faces mentalmente. O termo dicotômico advém do grego dichotomía que significa divisão em duas partes, o que desfaz as concepções anteriores para as quais o signo era diático ou triádico. O signo, a partir de Saussure, deixou de ser uma soma de dois ou três termos para se tornar uma divisão de um único e mesmo termo em dois.

Quando postulou o signo como uma entidade puramente psicológica (CLG, 40 e ELG, 24 e 117) que existe dentro de nossa cabeça (ELG, 117) sendo ele uma operação de ordem psicológica simples (ELG, 117) e, ainda, que não é o pensamento quem cria o signo, mas o signo que determina, primordialmente, o pensamento (ELG, 45), foi além, o gênio de Genebra porque rompeu com o que havia de vigente, a esse respeito, até então e lançou novas bases que redefiniram os pensamentos filosófico e psicológico de seu tempo.

A compreensão do signo como uma entidade psíquica, cuja existência é mental, trouxe a conclusão de que o mesmo deixou de ser nominalista, como pretendia Platão, porque passa a inexistir na essência do objeto nomeado. O signo também perdeu sua motivação no objeto dado tornando-se arbitrário. A própria condição de existir apenas na mente humana implica numa condição desvinculada do compromisso ou não com a verdade discursiva de representatividade do universo circundante, como postulavam, respectivamente, Aristóteles e os Sofistas, porque, uma vez mentalista, seu compromisso parece ser com a organização do pensamento em signos para traduzir a idéia do emissor.

Neste ponto, se faz importante destacar que significado; o conceito que se tem do signo e significante; a impressão acústica são fenômenos de ordem psíquica que estão ligados por associação dentro do cérebro e que essa ligação entre ambos é, também, de natureza desmotivada; arbitrária. Inexiste uma motivação no significante para que se ligue ao significado, a não ser pelo convencionalismo social.

É importante estar consiente também de que Significado e significante não podem ser tomados um dissociado do outro. O signo é esta associação indissolúvel entre ambos. O significante diz respeito à imagem mental que se faz quando o ouvido recebe as impressões de uma sucessão de ondas sonoras. Quanto à produção articulatória dos sons é de ordem fonológica ou acústica.
Uma vez mental e arbitrário, o signo pressupõe compartilhamento coletivo, generalidade, exterioridade e coercividade.

A generalidade signica ocorre quando indivíduos de uma mesma comunidade de fala o compartilham. Ele é externo no que diz respeito ao seu uso corrente; um idioma é compartilhado por seus falantes e sua existência já não depende deles. O fato de falarmos o português no Brasil, e de nossos filhos aprenderem o mesmo idioma, em pouco tempo após terem nascidos, se dá pelo poder de coercividade do signo lingüístico, uma vez que não está ao alcance do indivíduo trocar coisa alguma num signo, uma vez esteja ele estabelecido num grupo lingüístico” (CLG, 41).

Esse conjunto de características – generalidade, exterioridade e coercividade – fazem do signo um fato social no rigor da Sociologia positivo-funcionalista de Durkheim.

Outra característica fundamental do signo é a linearidade. Esta se dá em função do tempo de produção das ondas acústicas que o projetarão no espaço físico. Quando pronunciamos uma palavra, ela surge no vazio do tempo e preenche um determinado espaço de tempo que corresponde à duração de sua emissão. Após sua produção tudo é vazio novamente, o que pode ser representado por um sistema fechado que ocorre de um ponto ao outro na linha do tempo.

Não poderíamos deixar de mensionar algo sobre figura vocal, forma e valor. Até mesmo porque muitas confusões são feitas acerca destes conceitos.


Há quem confunda significante com figura vocal, o que seria um equívoco. O primeiro, como já pudemos observar, é parte indissolúvel do signo psíquico, e só tem existência na mente humana. O segundo diz respeito à produção fonológica ou à representação gráfica do signo quando este é tomado isoladamente; uma palavra fora da frase ou oração, por exemplo. Isto porque, no instante em que o signo perde a totalidade de suas significações, ele nada mais é do que uma figura vocal (ELG, 44).

A forma é a figura vocal no dado instante em que é introduzida no jogo de signos ao qual chamou-se língua (ELG, 38); é a palavra em uso.
Neste ponto, é bastante interessante saber que, para o gênio genebrino a palavra é o signo da idéia e a idéia o signo da palavra (ELG, 44), e, portanto, um signo só é numa situação comunicativa, seja ela mental ou social.

Saussure considerou que uma forma não significa, mas vale (...) e, por conseguinte ela implica a existência de outros valores. (ELG, 30).

Entenderemos melhor o sentido de valor da forma a partir do seguinte exemplo:
Tomemos uma moeda de R$ 1,00 (Hum real). O seu valor não é calculado pela quantidade de metal gasta em sua fundição, tão pouco pelo trabalho empregado para desenhá-la e fabricá-la. O seu valor é encontrado nas relações sociais de troca. Hoje, talvez, se consiga trocá-la por cinco pães franceses, e esse será o seu valor. Talvez, amanhã, devido a uma possível alta no preço do trigo no mercado interno, o seu valor seja o de apenas dois pães, ou, por conta de uma baixa do trigo, venha a ser de sete pães.

Tudo é muito relativo nas relações sociais de troca, assim como é relativo o valor lingüístico da forma. Uma forma, então, valerá, (significará) o que nenhuma outra significa dentro de uma mesma relação. E seu significado resultará da diferença de valor das formas.

Em suma, uma palavra é o resultado significativo de sua relação com as demais dentro de um enunciado. E apenas nessa situação, e em nenhuma outra mais, poderemos encontrar o seu valor (significado); dentro do contexto em que foi empregada.

O nosso próximo tema tratará da dicotomia Langue/Parole.

sábado, 15 de setembro de 2007

O signo pré-saussuriano...

Compreender as teorias dicotômicas de Saussure é tão importante quanto o entendimento do que significaram e que contribuições trouxeram não só para o estudo científico da linguagem como, também, para redefinir os pensamentos filosóficos e científicos vigentes até então.
Buscaremos tal compreensão a partir da teoria do signo saussuriano. Porém, se faz necessário saber que, desde a Grécia antiga, o signo vinha sendo motivo de especulações numa tentativa de desvendar a relação língua/pensamento/realidade, e, por isso mesmo, trouxe consigo uma sucessão de conceitos até atualidade.
Inicialmente, entre os gregos pré-socráticos se destacaram as considerações dos panteístas, da Escola de Eléas e Demócrito e seus seguidores:
Os panteístas concebiam o logos como uma inteligência divina que governava o universo. Para eles a palavra possuía uma função divina e também humana. Entendiam que linguagem, pensamento e saber eram inerentes ao homem.
Parmênides, membro da Escola Eleática, fundadora dos princípios básicos da Lógica, levou tal discussão além, afirmando serem o ser e o pensar a mesma coisa. Isto implica em que, ao pensar, o ser é e se manifesta pela linguagem, segundo princípios lógicos.
Demócrito e seus seguidores, a partir de sua teoria do atomismo, mudou o curso da discussão ao supor que a linguagem possuísse caráter convencional, uma vez que fora criada pelo homem para descrever as coisas ao seu redor, porém, considerou que os nomes surgiam da impressão que tinha a alma humana dos átomos da superfície das coisas.
Entre os pós-socráticos as considerações de destaque acerca do signo são de Platão e Aristóteles.
Platão, para quem o mundo real era uma pálida imitação do mundo das idéias, considerou, através, principalmente, do Diálogo de Crátilo, que a linguagem vem da natureza das coisas. E que essas mesmas coisas deverias ser nomeadas, imperfeitamente, por um legislador, dialético, dotado do dom de apreender, de tudo, sua natureza essencial.
Aristóteles, em oposição aos ideais platônicos, acreditava num mundo perceptível sensorial. Defendia que as funções intelectuais do homem possuíam caráter político, e deveriam ser desenvolvidas em sociedade. Dessa forma, a linguagem era fruto do convencionalismo - em que as categorias do pensamento coincidiam com as categorias da linguagem - e representaria a realidade na qual os homens se inseriam.
Para os sofistas o signo exercia uma função representativa sim, mas não a de representar a realidade ao redor, isto, porque, para eles, a linguagem não possuía compromisso algum com a verdade ou realidade circundante. No entanto, foram os Estóicos os primeiros a oferecer ao mundo uma teoria que considera três componentes integrantes do signo: o significante, o significado (ou sentido) e o objeto externo (referido).
Na Idade Média, Santo Agostinho retoma o caráter triádico do signico estóico.
Nessa mesma época, algumas teorias ganharam relevância: no período da escolástica, houve, por parte das autoridades clericais, uma tentativa de conciliar os pensamentos cristãos com a filosofia grega, principalmente a aristotélica. Inicialmente, a discussão se deu em torno dos universais e dizia respeito à questão do status ontológico e da relação entre os signos para conceitos genéricos e sua referência. O termo universal designava conceitos (idéias) de caráter geral. As correntes do realismo e nominalismo surgiram daí. A primeira afirmava serem os universais coisas reais, cuja existência estaria na pluralidade dos objetos individuais. A segunda, ao contrário, afirmava que só os indivíduos existiam na natureza, e que os universais seria apenas os nomes; as emissões vocais.
No séc. XVI, após o rompimento do pensamento filosófico com as doutrinas escolásticas, surgiu, na Península Ibérica, um discípulo de São Tomás de Aquino, João Poinsot (1589-1644), conhecido como João de São Tomás, que lecionara na Universidade de Salamanca e deixara um Tratado sobre os signos no qual fazia uma síntese filosófica entre a escolástica e a filosofia grega. Nele, propôs que a relação entre o signo e a capacidade cognitiva pode ser tanto formal quanto instrumental. Na primeira, o signo representa a si mesmo, na segunda, representa outra coisa, podendo fazê-lo por convenção ou costume.
Para o racionalismo francês de Descartes (século XVII) a estrutura do pensamento e da razão é comum a todos os homens, enquanto que a diversidade das línguas é apenas um fenômeno superficial porque os sons variam e as idéias são invariáveis. Ao priorizar o conhecimento intelectual sobre a experiência perceptiva, sobrepôs o sentido (conceito) à referência (coisa).
A escola francesa de Port-Royal desenvolveu uma semiologia que teve grande influência sobre o pensamento racionalista. Foram seus principais representantes: Antoine Arnauld (1612-1694), Claude Lancelot (1616-1695) e Pierre Nicole (1625-1695) que nos legaram dois textos fundamentais: a Grammaire générale et raisonnée (por Arnauld e Lancelot, em 1660) e La logique ou l’art de penser (por Arnauld] e Nicole, em 1662). Tal semiologia está fundamentada no modelo diático e mental do signo. Nele, estão combinadas a idéia da coisa que este representa e a idéia da coisa representada; ou, um par de entidades conceituais, em que, o significante é uma imagem do som.
Considerado um dos fundadores da lógica simbólica, o alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) se concentrou nos signos visuais e escritos por tomá-los como caracteres que seriam representações mentalmente visíveis dos conceitos, antecipando em dois séculos as considerações signicas a serem feitas por Peirce.
Por fim, para Charles Sanders Peirce (1839-1914), o signo, seria uma combinação triádica, em que um dos elementos é o objeto, cujo sentido é construído por meio do representamen (a própria palavra) e do interpretante (idéia mental do intérprete).

Seguiremos com o signo saussuriano.


Bibliografia Consultada.

* Além das sugeridas pelo Lingüístic@.com

ARISTÓTELES. Arte Retórica e Arte Poética. Trad. Antônio Pinto de Carvalho. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1964.

BARTHES, Roland. Elementos de semiologia. Trad. Izidoro Blikstein. 11 .ed. São Paulo : Cultrix, 1996.

Filosofia da Linguagem. Tradução Álvaro Cabral. Zahar editores, Rio de Janeiro.

PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica e Filosofia. Trad. Octanny Silveira da Mota e Leonidas Hegenberg. 2. ed. São Paulo : Cultrix/ EdUSP, 1975.

PLATÃO. Teeteto. Trad. C. A. Nunes. Belém : Univ. do Pará.

SILVA, Deonísio. De onde vêm as palavras. 5. ed. São Paulo : Mandarim, 1997.

SOUSA, Maurício de. Mensagem de Paz. In: ––. Mônica. São Paulo: Globo, abril 1999, p. 53-62.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Definições de uma ciência moderna da linguagem


O Cours de Linguistique Générale de 1916 consiste na leitura que alguns dos alunos de Saussure fizeram daquilo que fora por ele postulado. Já os Escritos de Lingüística Geral são compostos por anotações feitas pelo próprio mestre e que, aparentemente, comporiam um esboço do que poderia vir a ser a sua própria publicação de um Curso de lingüística geral e, ainda, por textos contemporâneos de outros discípulos seus. Tanto em um quanto outro, está retratada sua grande preocupação em definir qual seria, exatamente, o objeto de estudo da Lingüística, e qual o melhor método de abordagem deveria ser adotado pela nova ciência.
Como um membro da corrente histórico-comparatista, Saussure acompanhou o desenvolvimento do estudo da linguagem de seu tempo. Foram de suma importância os estudos realizados até então. Elucidou-se muito a cerca da pluralidade dos idiomas e da semelhança entre alguns deles. A descoberta das semelhanças fonológicas apontou para comunidades de fala que poderiam ter sido uma só no passado, e que, posteriormente, se espalhariam pelos continentes europeu e asiático. Porém, tais descobertas mostraram-se mais significativas para os estudos antropológicos que para os estudos lingüísticos. Aliás, esse era um dos problemas da Lingüística de então, servir-se de condutor informativo para ciências paralelas. Para Saussure a razão para a existência autônoma da Lingüística ainda estava por ser apresentada. Enquanto questionava sobre os possíveis porquês de ainda não se haver determinado objeto e metodologia da ciência da linguagem até então, lançava, aos alicerces dos estudos contemporâneos da linguagem, sua pedra angular. Ocupou-se com a necessidade de se separar os fenômenos interno e externo da língua, definindo seu caráter dual; psicológico e físico. Defendeu a análise do fenômeno lingüístico a partir de um instante específico de ocorrência de fala (sincrônico); de um dado estático, e não mais do ponto de vista de sua evolução no tempo (diacrônico), como faziam os comparatistas. Considerou as ocorrências dos fatos lingüísticos de forma encadeada, funcional e estrutural, como em um sistema, em que um elemento é interdepende do outro para realizar sua própria função e colaborar na função de todo o sistema. Afirmando, ainda, que cada “peça” ou elemento dessa cadeia de relações só é igual si mesma em função e posição e a nenhum outro elemento nesta relação. Teorizou sobre a arbitrariedade e a dupla face psicológica do signo - em que um signo e sua significação fazem parte do domínio psíquico interno e um signo (uma sucessão de ondas sonoras), ou uma figura vocal, configura o domínio psicológico de ordem externa-. E, assim, mesmo sem trazer à luz o livro que intencionara publicar e que traria novas diretrizes dos estudos lingüísticos, como teria confessado através de epístola ao seu amigo parisiense Antoine Meillet (ELG, 15), conseguiu tirar os estudos da linguagem do campo das especulações das mais variadas áreas afins para dar-lhes caráter cientifico próprio e autônomo.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Lingüística, a ciência das oposições inta-sistêmicas.




Saussure pensou sobre os fenômenos da linguagem durante o período em que manteve a cátedra de gramática comparada, ou de Lingüística Geral, como era corrente rotularem, na época, os estudos lingüísticos na França, Alemanha e Inglaterra. Antes de tudo, ele foi um filósofo da linguagem, buscando entender seu funcionamento, sua função, sua origem e essência. Suas reflexões abrangem efetivamente três campos do saber; a epistemologia – analisando a possibilidade de uma prática científica; a especulação analítica ou filosofia da linguagem e a reflexão prospectiva sobre a disciplina ou epistemologia programática em que apostava numa ciência futura. Seus pensamentos acerca da linguagem estavam fundamentados na epistemologia da gramática comparada (épistémè do séc XIX) e na epistemologia da filosofia da linguagem da segunda metade do séc XVIII. Assim, houve uma reorganização da ciência lingüística que passa a tratar sincronicamente da semântica e diacronicamente, da fonologia.
Acreditou o mestre de Genebra que a lingüística futura deveria recuperar os objetos tradicionais da morfologia, lexicologia e da sintaxe bem como os da retórica e estilística. Propôs um estudo unificado desses objetos com base no princípio de opositividade intra-sistêmica, em que cada elemento encontra seu valor na relação de oposição que estabelece com os demais elementos dentro do sistema lingüístico.
Apesar do Cours de Linguistique Générale de 1916, é nos seus manuscritos que seus pensamentos fluirão de forma mais límpida e profunda à cerca dos critérios a serem adotados para que se fundamente um estudo científico da linguagem. Saussure, de próprio punho, apesar das notas fragmentárias, mostrou-se menos categórico quando revela suas dúvidas e pensamentos sobre os pontos fundamentais do estudo lingüístico, e mais radical ao tecer críticas à falta de reflexões epistemológicas que caracterizavam a Lingüística de seu tempo.

sábado, 11 de agosto de 2007

O gênio genebrino

Ferdinand de Saussure, 26 de novembro de 1857 (1857-1913).




Nasceu em Genebra, proveniente de uma família francesa que contava com cientistas como geólogos, naturalistas e gramáticos. Ainda jovem, aprendeu latim, alemão, inglês, grego e sânscrito. Em Genebra, deu início aos estudos de Química e Física logo abandonados para que pudesse dedicar seu tempo aos estudos da linguagem. Foi a Leipzig e a Berlin, onde estudou o antigo persa. Em 1878 publicou sua fundamental Memória sul sistema il persiano delle vocalli nelle lingue indoeuropee na qual postula a existência das entidades vocálicas sob o ponto de vista estrutural e não simplesmente vocálico - com exceção desta, quase nada mais foi publicado por ele -. Em Paris, lhe ofertaram a cátedra de gramática comparada, que manteve entre os anos de 1906 e 1911. Durante esse período, a partir de anotações feitas no decorrer de suas aulas, seus discúpulos Charle Bally e A. Sechehaye com a colaboração de A. Reindlinger, Payot, Lausanne-Paris publicaram postumamente o Cours de Linguistique Générale, obra fundadora das ciências humanas do século XX.
Em 1996, num anexo da residência de Saussure, em Genebra, foram descobertos textos de sua própria autoria que deveriam compor um livro sobre lingüística geral. Tais textos encontram-se depositados na Biblioteca pública e universitária de Genebra e publicados nos
Escritos de Lingüística Geral, de Ferdinand de Saussure, organizados e editados por Simon Bouquet e Rudolf Engler, editora Cultrix.
O Lingüística.com
deverá trabalhar e analisar os conceitos lingüísticos à partir do diálogo entre as duas obras supra citadas.